
Na noite de ontem (15/04) nos reunimos para discutir a segunda obra proposta em nosso Clube do Livro: “As Aventuras de Tibicuera”, publicado por Érico Veríssimo em 1937. Voltada para o público infantil, mas com uma linguagem quase que paradidática, o livro traz como protagonista um indígena Tupinambá ao longo de quase 500 anos, num processo colonizador e “civilizador” tão agudo que desconcerta.
Narrado em primeira pessoa, como que pelo próprio Tibicuera, o narrador tece comentários o tempo todo sobre o seu passado (“selvagem”, “ignorante”, “temerário”) frente ao seu presente letrado, cristão e erudito, em que escuta Beethoven enquanto escreve à máquina.
Grande amigo do protagonista ao longo do livro é o padre José de Anchieta, que o catequisa e a quem Tibicuera segue com uma indolência inimaginável. Nas palavras do narrador, o acompanhava “como um cão fiel”. Na hora de encenar os autos de natal, implora para que possa representar o “burrinho”. A cena mais impactante, contudo, é quando o jesuíta o convence que Curupira, Anhangá e os demais seres que Tibicuera já havia encontrado não existem.
“Tu viste os espíritos do mato porque estavas cego. Cego é aquele que não conhece o Deus verdadeiro”. De posse de um crucifixo, Tibicuera vai ao mato e desafia os espíritos. Ninguém o confronta. “’Os gênios do mato morreram’” – pensei. E voltei para o colégio’”.
Ao longo de todo o livro eu tive esperança de que haveria uma reconciliação. Curupira reapareceria, mostrando que continuava onde sempre esteve ou algo assim. Não é o que acontece… Em uma etimologia também questionável, Érico Veríssimo diz que Tibicuera significa “cemitério”, lugar abandonado. Parece ser essa a ideia: o protagonista é um cemitério vivo de uma cultura que ele abandona de bom grado.
Nosso exercício foi pensar o que fazer a partir daí. Como estaria Tibicuera hoje? Os acontecimentos do Estado Novo até o presente seriam suficientes para fazê-lo mudar de perspectiva ou para extremá-lo ainda mais? E se Tibicuera é “cemitério”, seria possível pensar em um personagem que representasse a Vida e a renovação? Alguém que atravessasse os séculos, vivendo outros acontecimentos-chave da história do Brasil (ou os mesmos, só que de outro ponto de vista)? Um personagem que não rejeite saberes tradicionais, mas os abrace e integre?
Muitas sementes de histórias foram plantadas. Quem sabe o que há de brotar!
Nos vemos no próximo encontro, dia 15 de maio, onde vamos discutir Maldito Sertão (2012) / Agouro (2019) do potiguar Márcio Benjamin. Em junho, retomamos os clássicos para ler Água Funda, de Ruth Guimarães (1949).
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