Por Andriolli Costa
Um saci bem diferente do convencional deu as caras na edição de 03/10/1909 da Revista da Semana. Aparece como um diabo, com cara, patas e chifre de bode, bem peludo e com duas pernas. Nem menção à carapuça se faz. Mais bizarra ainda é a versão publicada na mesma revista um ano depois, em 02/10/1910. Parece um cachorro – ou anta – com as pernas no lugar da boca.
É possível supor que a figura do saci, na época, havia sido tão pouco homogeneizada pelo Brasil que dava origem a tantas representações estranhas. No entanto, a resposta pode ser mais simples que isso.
O ilustrador José Luiz Ohi – que inclusive é um dos membros fundadores da Sociedade dos Observadores de Sacis – aponta que provavelmente trata-se de um abrasileiramento na tradução. “Poucos eram os cartunistas aqui no brasil que poderiam ter feito esta HQ com o dito Sacy na época. É provável que tenha ocorrido o mesmo que foi feito com o grande personagem dos ‘quadrinhos nacionais’ de então, o Chiquinho“.
Grande sucesso do período, as tiras do Chiquinho eram publicadas na Revista FonFon, fundada em 1905 e especializada no público infantil. Em verdade, Chiquinho era o nome dado ao brasil ao personagem Buster Brown, de Richard Outcault – uma tirinha publicada no New York Herald desde 1902. A versão brasileira do produto se dava de início inteiramente na tradução, até que a partir de 1914 Luís Gomes Loureiro passou a criar histórias e personagens para o Chiquinho exclusivamente nacionais, como o cachorro Jagunço.
Para Ohi, tendo em vista o período, é mais provável que os quadrinhos tenham sido calcados em papel vegetal e com alterações na legenda para se tornarem made in Brazil. “Fica faltando saber quem e de onde vem este desenho. Talvez algum europeu, tipo Max and Moritz, ou mesmo Sobrinhos do Capitão, dos que se passavam na África tendo os brancos colonizadores como personagens principais e a fauna nativa como pano de fundo. Note que o ‘sacy’ parece mais um elefantinho”.
A opinião de Ohi é corroborada quando observamos uma tirinha publicada já em 1930 pela Revista FonFon que abre esta postagem. Nela a legenda informa que os protagonistas foram servidos por sacis, que moravam nos lírios e nas rosas. O desenho, entretanto, mostra claramente um duende com asas de inseto tal qual uma fada. De saci mesmo, só o nome. Será que para o editor/tradutor qualquer duende ou demônio da história ficaria mais atraente sendo chamado saci? O leitor pode conferir abaixo as tirinhas e tirar a prova. Basta clicar para ler maior. Divirta-se!